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Atualidades do Federalismo Europeu: Agências Reguladoras

Trata-se de relatório apresentado, em coautoria com Sérgio Julián Zanella Martínez Caro, como condição para obtenção do certificado de organização da 1ª Semana de Internacionalização no programa de Mestrado Profissional em Direito, Compliance, Mercado e Segurança Humana, da Faculdade CERS, sob a liderança das Profª. Drª. Laís Bergstein e Profª. Drª. Sophia Vial, realizada de 15 a 19 de mar. 2021.

 

RESUMO

Dentre as várias tendências de fomento a favor do federalismo europeu é considerado positivo o fenômeno integrativo concorrencial, financeiro e securitário dos Estados-membros causado pela transferência consentida da soberania. Neste relatório propõe-se registrar as informações proferidas pelo Prof. Dr. António Eduardo Baltar Malheiro de Magalhães, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, verificando na bibliografia indicada se existem mais ensinamentos que corroboram com o contexto geral da palestra proferida no dia 18 de março de 2021, na 1ª Semana de Internacionalização do programa de mestrado profissional da Faculdade CERS, contribuindo assim para o aprofundamento do conhecimento do tema. Para tanto, além de estar telepresencialmente no momento da palestra, foram feitas perguntas adicionais. As conclusões alcançadas pelo palestrante e registradas neste relatório podem auxiliar na percepção de que a independência das autoridades reguladoras está na capacidade do sistema impedir que seja capturada pelos regulados.

 

Palavras-chave: Integração. Independência. Autoridade reguladora.

 

1 INTRODUÇÃO

 

O objeto deste relatório será a descrição objetiva dos ensinamentos do Prof. Dr. António Eduardo Baltar Malheiro de Magalhães na palestra de 18 de março de 2021, às 8h, na 1ª Semana de Internacionalização do Mestrado Profissional da Faculdade CERS, sob o tema: atualidades de federalismo Europeu, agências reguladoras.

A 1ª Semana de Internacionalização do Mestrado Profissional da Faculdade CERS, no programa de Mestrado Profissional em Direito, Compliance, Mercado e Segurança Humana, foi organizada pelas Profas. Dras. Laís Bergstein e Sophia Vial, entre os dias 15 e 19 de março de 2021.

O evento foi realizado no formato virtual, via Zoom aos alunos do mestrado e via Youtube para o público em geral, e contou com a participação de especialistas de diversos países.

Nos dois primeiros dias do evento as palestras focaram na atualização do conhecimento jurídico acerca da proteção aos consumidores em situação de vulnerabilidade contra práticas agressivas das empresas, e dos novos caminhos da seguridade social chilena como exemplo para a América Latina.

Nos dois dias seguintes, 17 e 18 de março de 2021, as palestras abordaram os temas das parcerias internacionais como modalidade de empreendedorismo viável, dos impactos do cenário econômico internacional na América Latina, e dos desafios das agências reguladoras diante das atualidades do federalismo Europeu.

No dia 18 de março de 2021, não foi possível a realização da palestra prevista para às 11h, do Prof. Dr. Juan Fernando Durán, cuja remarcação e divulgação será feita em data próxima.

A finalização do evento, enfim, ocorreu no dia 19 de março de 2021 com a palestra do Prof. Dr. Mateja Djurovic, às 11h, tratando do tema da formação e eficácia dos contratos inteligentes.

A justificativa e ideia central deste relatório, além da obtenção do certificado de organização de evento, é a participação ativa em evento promovido pelo programa de mestrado profissional capaz de auxiliar as Professoras organizadoras no próximo exame de qualificação da dissertação no quesito do engajamento dos mestrandos às atividades disponibilizadas ao longo do vínculo acadêmico.

 

2 DESENVOLVIMENTO

 

Na perspectiva de Magalhães o modelo regulador é novo e veio perturbar o sistema organizatório da administração pública (informação verbal)[1].

Além disso, foram as seguintes informações verbais proclamadas pelo palestrante no mesmo evento referenciado:

A legitimidade constitucional das autoridades administrativas independentes, que incluem as autoridades ou entidades reguladoras, precisou ser incluída na Constituição da República de Portugal, de 1976, nos arts. 266, 267 e 268.

Destaca o princípio da descentralização e desconcentração como norteadores desse modelo regulador, e que a autoridade administrativa independente é uma entidade pública que está integrada à organização do Estado, mas é tendencialmente não subordinada às ordens do governo, do Poder Executivo.

Ressalta que é defensor do municipalismo, e não do federalismo. E que a regulação do conjunto de entidades independentes na economia é um aspecto positivo do federalismo Europeu.

Afirma que a administração pública não deve perseguir interesses privados ao entregar um serviço ao particular, mesmo considerando a transformação da natureza do Estado, na década de 80 do século passado, com a ampliação das privatizações, passando de prestador de serviços públicos a um Estado de garantia, com função de regulação e supervisão da economia.

Reverbera que serviços públicos tradicionais, na linguagem Europeia, passaram a ser serviços econômicos de interesse geral, e que o Estado Social não acabou, mas mudou sua forma de atuação, não prestando mais diretamente os serviços públicos. Afirma que não existe um Estado pós-social, e que é certo dizer que existe um novo Estado Social, que é justamente o Estado Regulador, o qual continua sendo um Estado de bem-estar e garantia.

As autoridades reguladoras servem para substituir a administração direta que o Estado tinha nas empresas públicas, mesmo que elas integrassem a chamada administração indireta, com base no fenômeno da devolução do poder.

Sustenta que quando há privatizações, as empresas devem manter algumas obrigações próprias dos serviços públicos, a exemplo da TAP (Transportes Aéreos Portugueses), a quem caberia oferecer tarifas aceitáveis para destinos como Madeira e Açores, mesmo sem lucro.

Destaca como ponto essencial no tema das agências reguladoras a notável diferença existente entre os modelos de regulação econômica americana e europeia.

A regulação surgiu em sentido inverso nos Estados Unidos da América e na Europa. Faz todo sentido dizer que as autoridades reguladoras são independentes em face do governo no modelo americano, porque lá as entidades privadas sempre atuaram de acordo com o princípio da autonomia da vontade e da liberdade contratual, e o Estado sempre teve pouca atuação direta na economia.

Assim, quando no modelo americano, contatou-se certa necessidade de intervenção no cenário econômico liberal, admitiu-se a criação de órgãos reguladores, com forte independência em relação ao governo.

No modelo europeu, mais especificamente em Portugal, já havia intervenção e participação direta do Estado na economia desde o início do século XX, com a produção de inúmeros bens e serviços através das empresas públicas. Quando o Estado resolveu privatizar essas atividades, houve a necessidade de criação das entidades reguladoras.

A confusão, assim, estaria na mistura entre os modelos europeus e americanos, que resultou na concessão abrupta de independência às entidades reguladoras europeias, em um modelo até então profundamente dependente do Estado.

Afirma que esse modelo de independência possui conflito interno com a grande preocupação no direito da União Europeia e sua tendência federalista de que as entidades reguladoras não são nem podem ser vistas como o 4º poder, independente dos demais poderes, sem sujeitar-se às ordens do Estado.

Destaca que a regulamentação do lobby torna menos opaca a tentativa de captura do regulador pelo regulado, mas que esse perigo é comum aos dois modelos.

Indaga: se toda a administração pública em última instância tem como órgão supremo o governo, na qualidade de titular de legitimidade democrática, faz sentido aceitar que a entidade reguladora não independentes? Responde que a legitimidade democrática procedimental não é a resposta apropriada para essa pergunta. E que não há independência, mas dependência perante as entidades que as regulam.

Preocupa-se com a legitimidade democrática e a inércia ou renúncia mais perigosa aos poderes que a administração faz dos seus poderes. Sem supervisão às reguladoras há inércia, como se constatou no setor financeiro português.

Apresenta a teoria da captura, expondo que as entidades reguladoras devem ser independentes não de baixo para cima, mas de cima para baixo. É dizer, as entidades reguladoras devem ser protegidas contra a capacidade de captura ou conquista pelos seus regulados.

Alerta que o perigo não está na independência em face de um órgão político legitimamente constituído, mas na independência àqueles que detêm a competência para regular os reguladores.

Salienta que a União Europeia é uma organização internacional supranacional de integração, e não de cooperação, na qual os Estados estão lentamente transferindo competências para a União. E que os regulamentos e as diretivas são atos legislativos da União Europeia que sinalizam a forte tendência federalista.

Destaca que a União define os fins e o Estado aplica os meios. E que o aval financeiro da União das economias locais cobra um preço significativo na soberania dos Estados. Não é a favor de uma federação europeia, pois entende a concentração e centralização do poder em Bruxelas não funcionaria para nações e culturas tão diversas como as existentes na União Europeia, devendo ser respeitada a soberania de cada um, citando os recentes problemas com o Brexit e com a rejeição do orçamento da Itália pela Comissão Europeia.

Destaca que o máximo de integração bancária, concorrencial, financeira, econômica, fiscal é uma tendência que funciona na busca pelo bem-estar dos povos e cidadãos europeus, sem esquecer o limite integrativo representado pelo princípio da subsidiariedade.

Avulta como aspecto positivo da União europeia a da integração das entidades reguladores do sistema financeiro e securitário, submetidas a um regulador supranacional, chamadas de agências de supervisão, em 1950, mas agora de autoridades reguladoras.

Afirma que as entidades reguladoras europeias foram legitimadas pela teoria dos poderes implícitos, com fundamento no art. 352, nº 1 do Tratado sobre o funcionamento da União europeia.

Refere, ainda, que o cidadão está mais protegido contra o Estado do que aos grupos privados, ressaltando a obra do Prof. Dr. Rogério Ehrhardt Soares.

 

 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desse modo, verifica-se que a palestra do Prof. Dr. António Eduardo Baltar Malheiro de Magalhães, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, sobre as atualidades do federalismo europeu, foi especialmente útil a fim de se compreender alguns dos dilemas pelos quais passa a União Europeia quanto à regulação econômica.

Para o palestrante, desde o início do século XX os países Europeus possuem histórico de serem Estados Sociais, de garantia de bem-estar social, tendo ao final do século passado migrado de um modelo de produção direta de bens e serviços, principalmente através de empresas públicas, para um modelo de privatizações e de concessão da prestação de serviços públicos a entes privados.

Disso, surgiu a necessidade de regulação da prestação privada dos serviços públicos, o que foi feito através da criação de entidades reguladoras independentes. Ocorre que, o modelo de regulação implementado pelos países europeus teria sido indevidamente importado dos Estados Unidos, país com histórico de ampla liberdade de atuação privada, e de pouca intervenção estatal na economia.

No entanto, no modelo Europeu, de forte interferência histórica dos Estados na economia, não se justificava a adoção abrupta da ampla independência das agências reguladoras. Ademais, destaca que essas entidades sofrem risco de captura pelos entes privados, e apenas o Governo possui legitimidade democrática, pois responde perante o Parlamento, eleito pelos cidadãos portugueses (no caso de Portugal).

Assim, defende que as agências reguladoras necessitam de independência apenas em relação às empresas reguladas, não havendo sentido em se admitir a existência de entidades reguladoras que não respondam ao Governo, responsável último pela defesa do interesse público e pela prestação dos serviços públicos, ainda que por meio de concessão à entidades privadas.

                                                    REFERÊNCIAS

PORTUGUAL. [Constituição da República Portuguesa (VII REVISÃO CONSTITUCIONAL 2005)]. Constituição da República Portuguesa, 1976. Disponível em: https://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx#art266 Acesso em: 23 mar. 2021.

 

SANTOS, Rodrigo Valgas dos. Direito administrativo do medo. Lisboa: Tenacitas, 2009. ISBN 9789728758189.

 

SOARES, Rogério Ehrahrdt. Direito público e sociedade técnica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2020. ISBN 9786556742890.

 

UNIÃO EUROPEIA. [Tratado sobre o funcionamento da União Europeia (versão consolidada]. Tratado sobre o funcionamento da União Europeia: atualizado, 2016. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_3&format=PDF. Acesso em: 23 mar. 2021.

[1]Informação fornecida por António Eduardo Baltar Malheiro de Magalhães na 1ªSemana de Internacionalização do Mestrado Profissional da Faculdade CERS, em palestra realizada em 18 mar. 2021, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NNwS2GOMZqE&t=5100s. Acesso em: 23 mar. 2021.